sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Nome de repressores


Vereadores Pedro Ruas e Fernanda Melchiona da Camara Municipal de Porto Alegre propõe trocar nomes de logradouros publicos, retirando as referencias aos repressores e abjuradores como Castelo Branco, cumplices como Tarso Dutra.

Esta Gazeta tem feito a mesma sugestão, no corrente ano de 2011, como um sentimento de justiça, em notas intituladas "Desmonumentar" inspiradas no mesmo movimento argentino conforme noticía Página12.

O jornalista e músico Nando Gross apoia publicamente a iniciativa. Outros colegas da imprensa são contra, aduzindo que "a cidade já está acostumada...".

Mérito para os vereadores, que instalam assim o debate. O argumento do "costume" parece com o seguinte: "como os escravos estão acostumados com os grilhões, mantem-se os grilhões dos escravos".

Há um modo de deixar o nome dos golpistas: acrescentar ao nome a expressão "Ditador" neste caso, em letras grandes, não é ?

Ficaria assim: Avenida Ditador Castelo Branco. Creio que seria didático, respeitaria o cidadão comum explicando o motivo da deshomenagem.

(Texto de autoria de Raul Ellwanger, extraído do periódico "Gazeta dos Tolos, nº. 109)

Aproveitem a liberdade.
Guilherme de M. Trindade

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Leonardo Boff: Crise terminal do capitalismo?


Buenas...há tempos não apareço por aqui (reflexos da vida proletária dos cidadãos que vivem em capitais)...assim, tendo em vista a diversidade de fatos que ocorreram nesse lapso temporal e, que mereciam nossa atenção, selecionei um texto bastante pertinente, extraído do blog do amigo e professor Ítalo Drago, no intuito de melhor aclarar a crise que assola países europeus, até então tidos como exemplos de econômia bem estruturada.

Espero que gostem tanto quanto eu.

Leonardo Boff: Crise terminal do capitalismo?


Já nos meados do século XIX Karl Marx escreveu profeticamente que a tendência do capital ia na direção de destruir as duas fontes de sua riqueza e reprodução: a natureza e o trabalho. É o que está ocorrendo. A capacidade de o capitalismo adaptar-se a qualquer circunstância chegou ao fim.

por Leonardo Boff, em Carta Maior

Tenho sustentado que a crise atual do capitalismo é mais que conjuntural e estrutural. É terminal. Chegou ao fim o gênio do capitalismo de sempre adaptar-se a qualquer circunstância. Estou consciente de que são poucos que representam esta tese. No entanto, duas razões me levam a esta interpretação.

A primeira é a seguinte: a crise é terminal porque todos nós, mas particularmente, o capitalismo, encostamos nos limites da Terra. Ocupamos, depredando, todo o planeta, desfazendo seu sutil equilíbrio e exaurindo excessivamente seus bens e serviços a ponto de ele não conseguir, sozinho, repor o que lhes foi sequestrado. Já nos meados do século XIX Karl Marx escreveu profeticamente que a tendência do capital ia na direção de destruir as duas fontes de sua riqueza e reprodução: a natureza e o trabalho. É o que está ocorrendo.

A natureza, efetivamente, se encontra sob grave estresse, como nunca esteve antes, pelo menos no último século, abstraindo das 15 grandes dizimações que conheceu em sua história de mais de quatro bilhões de anos. Os eventos extremos verificáveis em todas as regiões e as mudanças climáticas tendendo a um crescente aquecimento global falam em favor da tese de Marx. Como o capitalismo vai se reproduzir sem a natureza? Deu com a cara num limite intransponível.

O trabalho está sendo por ele precarizado ou prescindido. Há grande desenvolvimento sem trabalho. O aparelho produtivo informatizado e robotizado produz mais e melhor, com quase nenhum trabalho. A consequência direta é o desemprego estrutural.

Milhões nunca mais vão ingressar no mundo do trabalho, sequer no exército de reserva. O trabalho, da dependência do capital, passou à prescindência. Na Espanha o desemprego atinge 20% no geral e 40% e entre os jovens. Em Portugal 12% no país e 30% entre os jovens. Isso significa grave crise social, assolando neste momento a Grécia. Sacrifica-se toda uma sociedade em nome de uma economia, feita não para atender as demandas humanas, mas para pagar a dívida com bancos e com o sistema financeiro. Marx tem razão: o trabalho explorado já não é mais fonte de riqueza. É a máquina.

A segunda razão está ligada à crise humanitária que o capitalismo está gerando. Antes se restringia aos países periféricos. Hoje é global e atingiu os países centrais. Não se pode resolver a questão econômica desmontando a sociedade. As vítimas, entrelaças por novas avenidas de comunicação, resistem, se rebelam e ameaçam a ordem vigente. Mais e mais pessoas, especialmente jovens, não estão aceitando a lógica perversa da economia política capitalista: a ditadura das finanças que via mercado submete os Estados aos seus interesses e o rentismo dos capitais especulativos que circulam de bolsas em bolsas, auferindo ganhos sem produzir absolutamente nada a não ser mais dinheiro para seus rentistas.

Mas foi o próprio sistema do capital que criou o veneno que o pode matar: ao exigir dos trabalhadores uma formação técnica cada vez mais aprimorada para estar à altura do crescimento acelerado e de maior competitividade, involuntariamente criou pessoas que pensam. Estas, lentamente, vão descobrindo a perversidade do sistema que esfola as pessoas em nome da acumulação meramente material, que se mostra sem coração ao exigir mais e mais eficiência a ponto de levar os trabalhadores ao estresse profundo, ao desespero e, não raro, ao suicídio, como ocorre em vários países e também no Brasil.

As ruas de vários países europeus e árabes, os “indignados” que enchem as praças de Espanha e da Grécia são manifestação de revolta contra o sistema político vigente a reboque do mercado e da lógica do capital. Os jovens espanhóis gritam: “não é crise, é ladroagem”. Os ladrões estão refestelados em Wall Street, no FMI e no Banco Central Europeu, quer dizer, são os sumossacerdotes do capital globalizado e explorador.

Ao agravar-se a crise, crescerão as multidões, pelo mundo afora, que não aguentam mais as consequências da superexploracão de suas vidas e da vida da Terra e se rebelam contra este sistema econômico que faz o que bem entende e que agora agoniza, não por envelhecimento, mas por força do veneno e das contradições que criou, castigando a Mãe Terra e penalizando a vida de seus filhos e filhas.


Aproveitem a leitura.

Guilherme de M. Trindade

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Pra refletir...


Os novos Joões (por Thiago Arantes)

Na década de 1950, quando o futebol ainda era jogado por seres humanos levemente barrigudos, com defeitos, sem assessores de imprensa e com pernas tortas, Garrincha inventou o “João”. João era qualquer um que marcasse o camisa 7 do Botafogo e da seleção brasileira.

João era todo mundo e era ninguém. Um dia era Zezinho, do São Cristóvão, pela terceira rodada do campeonato da Guanabara; noutro era Ladislav Novak, da Tchecoslováquia, na final da Copa do Mundo. João era o complemento perfeito de Garrincha, o coadjuvante que fazia brilhar o jogador brasileiro mais brasileiro que o futebol conheceu.

O João, catapultado da cabeça de Garrincha para a mitologia do futebol, virou marco de uma época. De um tempo distante em que o jogador fazia o que gostava de fazer, como gostava de fazer, quando gostava de fazer. De tempos em que era comum terminar a partida, subir no ônibus e ir embora para casa depois deixar o estádio de chinelo de dedo, andando entre os torcedores.

O João de Garrincha, grande personagem do futebol brasileiro, é símbolo de uma época que não voltará mais. O João, driblado, humilhado, avacalhado por Garrincha, ia de um lado para o outro atrás do camisa 7. Era feito de bobo, era graça pura. Era sorriso certo.

Pois não é que, meio século depois, o futebol brasileiro ganhou um novo João?

(Pausa para me acalmar, pensar BEM no que escrever e tomar o remedinho).

Pois é, negada. Seguinte: algum gênio da leifertização esportiva, ou da tadeuschmidtização do telespectador, inventou que jogador tem que comemorar gol imitando uma porcaria de um boneco. Cujo nome sugestivo é João Sorrisão.

Nenhuma referência ao João de Garrincha, gracias. Por que o cidadão que inventa isso com certeza não tem cultura futebolística suficiente para ligar dois pontos tão distintos da história.

Fato é que, um belo dia, o gênio inventou que quem imitasse um joão bobo em comemoração de gol ganharia um boneco.

E daí?

E daí que a ideia tinha tudo para ser um fracasso. Afinal, o Brasil é o país que viu Pelé imortalizar o soco no ar, Ronaldo balançar o dedo indicador, Viola imitar o porco, Paulo Nunes revolucionar a profissão de drag queen, entre outras comemorações históricas.

Não ia dar certo, claro que não ia porque aqui no Brasil os jogadores são criativos e nunc… Bom, mas deu certo, sim.

Virou mania a tal comemoração. Claramente superestimei a inteligência dos jogadores brasis, um erro primário para quem já está há pelo menos dez anos na janelinha do jornalismo esportivo.

Deve ter um mês e meio que a babaquice começou. E não há sinais de que ela vá parar. Para os jogadores, é a chance de aparecer em rede nacional – e dane-se se é imitando um joão bobo. Para a emissora nave-mãe, é a forma de mostrar o poder que exerce sobre os clubes, atletas e torcedores.

E pra quem gosta desse negócio de futebol, pra quem gosta de ver uma comemoração como a de Falcão no gol contra a Itália de 1982, para quem acha o máximo ver Tevez salvar o West Ham do rebaixamento e pular no meio da torcida – da torcida! – sem camisa, vibrando como se fosse um deles?

Falo por mim: acho imitar boneco por sugestão de uma emissora de TV um desrespeito sem tamanho.

Em vez de abraçar o técnico, de correr para a galera, de chorar caído no chão, o sujeito imita um joão bobo para ganhar um boneco? Putz.

Meus parabéns, caro jogador. Você acaba de trocar um momento de emoção com o seu torcedor, um alambrado, meia dúzia de lágrimas e abraços por um boneco de plástico.

O futebol dos tempos de Garrincha já se foi e não vou ficar falando que era melhor ou pior. Outros tempos, outro esporte. Não sou do time que gostaria de ver Garrincha jogando hoje em dia.

O futebol mudou. Ficou mais profissional, mais chato, mais não-pode-bandeira, mais não-pode-tirar-camisa. Mais me-manda-as-perguntas-por-email.

Aliás, melhor deixar Garrincha quietinho no canto dele. Hoje, o camisa 7 seria engolido por torcidas organizadas que o chamariam de cachaceiro. Seria pivô de crise com técnicos por faltar a treinos. Seria vetado por fisiologistas pelas pernas tortas.

Mas de uma coisa, pelo menos de uma, Garrincha iria gostar: os Joões de hoje são muito bobos. Bem mais bobos do que os laterais que ele enfrentou pelo mundo afora.

Texto retirado do Boteco do Arantes
Aproveitem a leitura.
Guilherme de M. Trindade

quarta-feira, 27 de julho de 2011

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Ensaio de um extraterrestre sobre o Brasil

(Guilherme Trindade)
Político é sinônimo de ilícito;
Autoridade confunde-se com impunidade;
Quem manda matar não é culpado;
Quem julga não é julgado;
O imposto tira o ovo da panela do proletariado,
transformando em ouro o patrimônio do votado;
A nata faz compras pela internet;
A moeda da rua é lata, é pet;
Vasculham-se fortunas na lixeira.
Fumam-se pedras em trincheiras;
E assim, crianças, velhos, jovens homens e mulheres,
carregando o lar em sacolas,
esquecem-se da esmola, da escola e dos talheres.
Cobertores em seus corpos são vestes,
pros horrores, o sepulcro.
Nas noites, o estupro,
dores e
frio,
sob os olhares do governo que não viu.

Aproveitem os sonhos.
Guilherme de M. Trindade

terça-feira, 17 de maio de 2011

A noite como se fosse

(Guilherme Trindade)
Distante, a noite,
tem a lua como foice
a cintilar no canto de seu manto.
É como se fosse
o acalanto,
pro choro do grilo,
que cansado de ser apito,
maldiga na madrugada
a sorte da cigarra.

Pobre grilo,
que aflito a chorar,
mal percebe que seu grito,
desnecessário melhor juízo,
é o bonito do luar.
Ademais, há quem diga,
menos sorte teve a formiga,
que sequer sabe apitar.

Estranhos estes
habitantes da madrugada.
Pequenos seres
de pequena sina.
Grilo, cigarra e formiga,
Que sob o sorriso da foice albina
são o apito, o canto e a vida

E neste cenário macabro e sem fim,
com seu aço ruim,
a lua
é como se fosse
candelabro que, em forma de foice,
só observa o capim.

Eu sou o grilo invejando a cigarra.
Em meu manto,
a foice que rasga a noite
é o grito da guitarra.
Este apito que faço em casa,
embora lembre o canto,
nada mais é que o pranto,
da formiga que cedo trabalha.

Guilherme Trindade

Aproveitem a poesia.
Guilherme de M.Trindade

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Colecionador de Pedras

Buenas queridos seguidores!

Há tempos não utilizo de nosso blog para exprexar-me...pra bem da verdade, não havia encontrado nada mais belo para dizer do que as poesias, letras, vídeos e textos ultimamente postados.

Ocorre, que felizmente, em minhas andanças virtuais, deparei-me com o blog "Colecionador de Pedras", magistralmente administrado pelo poeta Sérgio Vaz.

Aos curiosos, informo que o link do blog encontra-se elencado no rol dos "Blogs Parceiros" a partir de hoje. Acessem!!!

Outrossim, para degustação, trago o poema de Sérgio Vaz denominado "Paz"...simplesmente genial!


"PAZ "

ETA mundo estranho

tanta IRA, tanto ódio

quando o que a MOSSAD

mesmo quer é

HEZBOLLAH.


Cd, OLP,

deixe a música tocar.

Neste ONU,

vamos celebrar a vida

pois temos a FARC e o queijo

na mão, basta acreditar.


Não importa o LADEN

que você está.

AL-QAEDA da tarde vamos nos

abraçar.

Solidão aos belicosos!

Quem USA e abusa

não merece CIA.

Vamos vigiar a paz

noite e dia,

para que não haja mais a guerra,

HAMAS!

(Sergio Vaz)

Aproveitem a poesia
Guilherme de M. Trindade

terça-feira, 19 de abril de 2011

A CRUZ DE CEDRO (Rodrigo Bauer)

Talvez tenha sido morto na guerra do Paraguai...
Ninguém o sabe por certo, que o tempo longe se vai
Num cemitério de campo plantou-se mais um cristão
E a Cruz de cedro, ainda verde, ficou cravada no chão.

No seu enterro pacato, poucos amigo, parentes...
É neles que permanece, pra sempre, um pouco da gente!
Depois, na noite com chuva, o campo inteiro sentiu
Mais uma ausência habitando o cemitério vazio!

O sol acendeu os dias e a vida então continuou
E a Cruz de cedro, ainda verde, vencendo a morte brotou...
Quando se deram por conta, de verde estava vestida
Uma ironia campeira marcando a morte com vida!

Em seu retorno pra terra, nunca talvez lhe ocorresse
Que emprestaria as entranhas para que a Cruz não morresse!
Ou sua alma guerreira, por ter a fibra imortal,
Ganhou a Cruz de madeira, se erguendo na vertical?

O tempo cruzou com tropas, carretas e temporais
E a Cruz abriu mais os braços pra receber os cardeais
Enraizou suas lendas e hoje, copando mistérios
Sombreia além dos antigos limites do cemitério!

Seu nome, a poeira da história, por certo já sepultou,
Mas sua Cruz é tão viva que, sem cuidado, brotou!
Descansa um homem sem nome dentro da cova sem luz..
Vencido pelo passado, velado por sua Cruz.

Aproveitem a poesia.
Guilherme de M. Trindade

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Penúltima China (Antônio Augusto Fagundes)

Tua penúltima china
vai ser uma bruxa feia
cheia de ciúme de ti.
Ela se chama Velhice.
De tudo o que já disse
sobre a sua casmurrice
há mais pra dizer aqui.

Ela virá de mansinho
a te encontrar no caminho
- tu quase não vai notar:
primeiro, um cabelo branco
(“Não é nada, esse eu arranco...”
tu vais dizer quase a rir)
Porém depois, sem sentir,
outro, mais outro, outro mais
- todo o cabelo! E jamais
tu vais tapear ao tingir.

Ou então, num desvario
vai te arrancar fio por fio
até pelar a cabeça,
para que ninguém se esqueça
do triste casco vazio.

E a china ali, ao teu lado,
com o manso passo grudado
no teu passo, a prosseguir:
vai pegar na tua cara
(que as mulheres adoravam!)
e riscar mapas profundos
-sulcos, vales, rios e mundos
pés-de-galinha nos olhos
sob os óculos de grau,
esmagando em gesto mau
estranhos, murchos refolhos
ao redor de tua boca,
como uma criança louca
que rabisca em desatino.

E a china, sem muito tino
vai trocar teus poucos dentes
por outros, mais reluzentes,
completos! De dentadura...
Vai te mudar a figura
pergaminhando o pescoço,
fazendo um velho no moço
que tu foste alguma vez.
Sempre assim, a dois por três,
vai dobrar teu espinhaço,
te deixar com os pés de arrasto,
sem pena do tempo gasto
pelos caminhos da vida.

Que china mais atrevida!

Vai te deixar barrigudo,
ruim – ruim de tudo!
Vai trocar tua bombacha,
tua guaiaca, tua faixa,
por um pijama de lista.
Depois, a fingida artista
rouba as tuas alpargatas
e as tuas botas gaúchas
para te calçar bambuchas
nas pobres, cansadas patas!...

E adeus, canha do bom tempo!
De cigarro? Nem te falo...
Não mais pular a cavalo
nem aguentar uma briga.
Agora é dor-de-barriga,
pressão alta, desconforto...
Ou é míope, ou vesgo, ou torto,
não come churrasco gordo
nem chega perto do sal.
La putcha, que no final,
o homem, velho animal,
é o mesmo que um burro morto.

Mas o que dói, nessa china,
nesse maldito cambicho,
é o seu estranho capricho
de te roubar a tesão.
Na hora da precisão
- com muito ciúme da outra –
te retira a velha potra
para te deixar na mão...

Diacho de china ciumenta,
essa que chamam Velhice!
Eu não sei quem foi que disse
que ela vence porque é forte.
No fundo, não que me importe,
mas posso te assegurar:
ela só vai te largar
pra última china - a Morte.

Aproveitem a poesia.
Guilherme de M. Trindade

quarta-feira, 23 de março de 2011

Ensaio sobre a pena e o medo


Pergunta: Como não sentir medo se temos pena?

Resposta: Tratam-se de sentimentos diversos que juntos se promovem.

Exemplos: Medo de que conosco se suceda o motivo da pena alheia, ou o inverso: sentir pena do medo alheio;

Exemplo prático 1: Pena dos orientais, vítimas das intempéries, seguida do medo íntimo de malograr com o mesmo fim;

A fórmula também funciona ao contrário, senão vejamos:

Exemplo prático 2: Medo de ser assaltado à porta de casa, seguido da pena do possível meliante maltrapilha que, provavelmente não ceia já tem bom tempo;

Exceções à regra: Existem. Geralmente ocorrem em casos de guerra ou em que envolvem genocidas, ditadores, e/ou ainda, quando das atividades desportivas.

Exemplo prático da exceção: Todos têm medo da guerra na Líbia, com exceção dos países do norte, porém, nem os países do sul sentem ou sentirão pena de Muammar Abu Minyar al-Gaddafi, quando este capturado for.

Os mais apressados e, não menos desatentos, poderão dizer que mesmo em se tratando da guerra, não há como escusar-se do sentimento da pena para com os civis inocentes que fenecerão perante a fúria bélica projetada no continente africano. A estes, tal reivindicação assiste razão. Porém, ao longo da história a guerra jamais fora interrompida diante destes pormenores, sob a velha justificativa de que os fins justificam os meios ou, segundo o dito que muitos se valem: não há omelete sem que alguns ovos sejam quebrados.

O presente ensaio não visa discorrer sobre a guerra ou suas atrozes conseqüências, eis que trata de mero ensaio sobre a pena e o medo e suas razões de juntos se apresentarem, motivo pelo qual este narrador desculpa-se pelo exemplo sanguinolento. Assim passemos ao exemplo de práticas desportivas.

Exemplo prático da exceção 2: Quando se desempenha uma atividade desportiva, embora a existência do medo, e aqui alguns chamarão de ansiedade, causado pelo embate ou pela necessidade da vitória, ignora-se a pena do adversário, ao qual se busca a glória.

Também haverá divergências quanto ao fato de sempre existir a pena do oponente quando este ocupa a condição de mais fraco, todavia, não podemos esquecer que no exemplo em questão, trata-se dos sentimentos do atleta para com o seu adversário, e não da torcida com relação aos competidores.

Para evitarem-se maiores discussões, retornemos à questão do ponto em que paramos, auferindo que a fórmula da exceção também funciona ao contrário:

Exemplo prático da inversão da exceção: Ninguém sentirá medo da leitura do presente ensaio, contudo, muitos poderão sentir pena deste narrador pela pouca prática na escriba, ou, pela singeleza deste divagar.

Aproveitem os devaneios.

Guilherme de M. Trindade

quarta-feira, 9 de março de 2011

Romance do Injustiçado (Apparício S. Rillo)

Como talhado em pau-ferro,
o carão de traços duros,
o bigodão mal cuidado
desabando sobre os lábios;
par de asas mui cansadas
de um avejão de cor negra.
Melena de muitos meses,
sobrando por sobre a gola
e o colorado de um lenço,
sangrando em riba do peito.

A bombacha de dois panos,
remangada sobre a bota.
Os cravos da espora grande
mordendo a franja do pala,
bem atirado pra trás.
No fivelão da guaiaca,
luzindo em campo de prata,
o louro das iniciais.

Sobrando da faixa negra
que lhe abarcava a cintura,
o cabo entalhado em chifre
da xerenga de dois palmos.
Um relho, trança de oito,
vinha arrastando a açoiteira
dependurado no pulso
pelo tento do fiel.

Pela rédea, o azulego,
se via que flor de flete
malgrado a estampa judiada
de pingo que muito andou.
Foi assim que há muitos anos
bateu nas casas da estância
o celebrado bandido
chamado “Estácio Arijo”.

Bandido
para a justiça,
por seu respeito se explique,
que as razões de um índio macho
nem sempre são bem aceitas
pelos códigos e leis.

Bandido
por ter sangrado,
igual de raiva e de armas
a um cujo que desonrara
a mais moça das irmãs.

Bandido,
porque apertado
entre as brigadas e a enchente,
já não podendo escapar
por debaixo da fumaça,
matou um dos quatro praças
que lo quiseram carnear.

Bandido,
porque seguido
por milicadas sequiosas
de uma vingança total,
fugiu da estrada real
para o mais fundo dos matos,
carneando chibos alheios
para o churrasco sem sal.

Bandido,
porque enleado
na rudez da ignorância,
fez da fuga e da distância
seu modo de mal viver;
porque quis a sina ingrata,
que nunca tivesse plata
para pagar um bacharel.

Bandido,
porque não teve,
a exemplo de tanta gente,
cancha livre, costas quentes,
à sombra de um coronel.

E assim viveu como bicho,
pelos fundões das fazendas,
a carregar a legenda
de perigoso e assassino,
ximbo, bagual, teatino,
com fama de touro alçado,
tragando o duro guisado
que lhe picava o destino.

N’algum bolicho de estrada
boleava a perna cestroso,
pelos domingos de tarde.
Para um cantil de cachaça,
meio quilo de bolacha
mais um punhado de sal.

Olhava de olhos compridos
para o mais das prateleiras,
pra um bom fumo amarelinho,
pros maços de palha buena,
para a erva de palmeira,
num saco sobre o balcão.
Mas vinha curto seu cobre,
mal e mal traz precisão;
o bolicheiro era pobre,
e ele não era ladrão.

E a polícia no seu rastro,
malgrado o tempo passado,
perseguido e acuado
por plainos e socavões,
sempre mudando de pouso
pra confundir os milicos,
que em manhas sim, era rico,
por evidentes razões.

Cansou-se um dia, afinal,
daquela vida de bicho,
daquele estranho cambicho
com as más volteadas da sorte,
de não ter rumo nem norte,
não ter descanso ou sossego.

E assim bateu cá na estância,
naquele entono de taita
que manda parar a gaita
por ter cansado do baile.
E ao patrão, velho Boerana,
pediu Estácio Arijo
que mandasse algum chirú
levar ao povo um recado:
que viesse o delegado,
que ele afinal resolvera:
ele, o bandido; ele, o maula,
trocar o largo dos campos
pelo encolhido das jaulas.

Nas suas noites de insônia,
entre um pelego e as estrelas,
conseguira convencer-se
que, sendo justa, a justiça
lhe entenderia as razões
e lhe daria, a lo muito,
poucos anos de condena
ou mesmo absolvição.

Foi então, que a meia tarde,
num fordecão atochado,
deu na estância o delegado
com quatro praças por quebra
para formar o sarilho:

quatro fuzis embalados,
quatro dedos no gatilho.

Então ... Estácio Arijo
tomou seu último mate,
no mesmo entono de guapo
que era seu jeito de sempre,
arrastou a espora grande
na direção dos milicos.

- Nem mais um passo!
gritou-lhe num gritinho de falsete,
o delegado, um joguete
nas mãos do chefe local.
- Levante as mãos!
- Largue as armas!
- Esteje preso, seu bandido,
seu metedor de pendenga!

E o Arijo, decidido
a entregar-se sem briga,
levou a mão à barriga
para descartar a xerenga.

- Cuidado! Berrou um praça.
Tremeram cinco covardes;
e na calma desta tarde
berraram quatro fuzis,
quatro sóis de fumo e sangue
se lhe acenderam no peito.

Foi desabando aos pouquitos
de frente para os milicos,
no jeito de um velho angico
caído junto às macegas
que lhe envejavam o entono.

E já quase adormecendo
para o derradeiro sono,
quatro vezes mal ferido,
teve ainda tino e ouvido
para escutar um dos cinco
que lhe gritava:
- Bandido!

Caiu ...
olhando pro céu,
tinto de sangue e de luz.
Dava-lhe o sol pela frente,
como a incendiar-lhe a figura,
a mais rica das molduras
para enquadrar um valente !


Aproveitem a poesia.
Guilherme de M. Trindade

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

POEMA PARA A EXORCISTA

A minha vida aparece sem condão e
monótona
aos que me vêem
no trabalho árduo da oficina
em manhãs apuradas.
A verdade é muito distinta.
Cada noite eu saio e discuto
contra um espírito malévolo
que, se valendo de
máscaras - cão, grilo,
nuvem, chuva, vagabundo,
ladrão - trata de
se infiltrar na cidade
para estragar a vida humana
semeando
a discórdia.
Apesar dos seus disfarces
sempre a descubro
e a espanto.
Nunca conseguiu enganar-me
nem vencer-me.
Graças a mim, nesta cidade
ainda é possível
a felicidade.
Mas os combates nocturnos
deixam-me exausta e ferida.
E para compensar a minha
guerra contra o inimigo,
peço uns restos
de afecto e de amizade.

Mario Vargas Llosa
Nova Iorque, novembro de 2001.
(versão de Pedro Calouste)


Aproveitem a poesia.

Guilherme de M. Trindade